Madalena Que Me Ensinou a Brindar

Olá.
Existem momentos em que o pensamento vagueia e, por algo inexplicável, um sentimento leve e prazeroso se mistura e marca profundamente. Por isso, compartilho agora um desses momentos que acabou de acontecer.
Abri um tinto italiano (Sangiovese) e, de forma despretensiosa, o pensamento me levou à minha história com Madalena — não a mulher, mas o bairro que me ensinou a brindar à vida, à arte e ao tempo.

A Vila antes da agitação

A Vila Madalena, em São Paulo, hoje é sinônimo de cultura, arte, bares, conversas e agitação. Mas, para quem não sabe, começou bem longe disso. Era uma vila calma, muito pacata.
A formação da Vila veio através dos portugueses. Na época em que vivi lá, nos anos 1970, as casas — em sua maioria pertencentes a famílias portuguesas — seguiam um padrão: uma casa para o proprietário, outra ou outras para os filhos, e uma para alugar.
Foi assim que eu morava: de aluguel. Embaixo, os proprietários; na parte superior, onde vivíamos; e ao fundo, mais duas casas — uma para cada filho. Claro que o terreno era grande. Rua Fidalga, 297.

A chegada dos estudantes da USP

Na década de 1960, a Cidade Universitária da USP (no Butantã) passou por um forte crescimento e estruturação. A partir daí, estudantes de todo o país começaram a se dirigir para São Paulo em busca de moradia próxima ao campus.
Lembra do modelo das construções que mencionei acima? Com uma casa para alugar? Pois é — adivinha para onde esses estudantes foram? Isso mesmo: Vila Madalena.
Ali, no espaço alugado, vários se juntavam e formavam repúblicas.

Cultura, repressão e resistência

Esses estudantes vinham de várias partes do país e do estado. Voltar para casa nos fins de semana e feriados era complicado — o custo, a distância, entre outros fatores, dificultavam.
E aí, o que fazer? Fácil: se juntar nos butecos da região, beber, tocar violão, jogar conversa fora.
Estamos falando de plena ditadura militar. E é claro que a repressão gerou um caldeirão efervescente de contracultura e movimentos artísticos.
Assim, vários artistas e artesãos fizeram da Madalena seu destino, sua casa.

Dos butecos aos barzinhos

No final da década de 1980, as casas e butecos deram espaço aos barzinhos. Agora, dia e noite, a Madalena se transformava: vida pulsante!
Tinha, definitivamente, deixado para trás a vila calma, tranquila, pacata.

A Madalena de hoje — e o vinho que me levou até lá

O tempo caminhou mais um pouco e vieram os restaurantes descolados, chefs criativos, gastronomia ousada.
E eu aqui, com meu Sangiovese erguido como quem brinda à memória, lembrando de tudo isso — da Vila que vivi, da Madalena que fermentou cultura, encontros e histórias.
O vinho já está no fim da taça, mas o sabor que ficou não é só da uva. É da memória. Do cheiro da rua molhada, das vozes que ecoavam nas calçadas, dos violões desafinados que embalavam sonhos.
A Madalena que conheci talvez não exista mais. Mas ela vive em mim — em cada gole, em cada lembrança, em cada silêncio que me visita quando o mundo desacelera.
E é por isso que, às vezes, tudo o que precisamos é de um bom vinho... para reencontrar quem fomos, e brindar — como Madalena me ensinou — quem ainda somos.

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Um Brinde,

Carlos Alves

Sobre o Autor: Carlos Alves possui mais de 35 anos de experiência em gestão e empreendedorismo nas áreas de Vendas e Comercial. Formado em Engenharia de Produção, Carlos tem ampla vivência em vários setores, incluindo alimentos e bebidas, e em empresas de diferentes tamanhos. Apaixonado pelo mundo dos vinhos, sua missão é desmistificar essa bebida e torná-la mais acessível, aumentando o consumo no Brasil. Para ele, o vinho é história, geografia, cultura e, acima de tudo, relacionamento, fazendo parte da história da humanidade há mais de 3.000 anos, sempre associado a momentos memoráveis e prazerosos.